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A adstringência é um fenômeno que, embora frequentemente subestimado, é crítico na definição da qualidade de uma cerveja, pois sua presença pode alterar drasticamente o equilíbrio e a percepção de outros sabores e texturas.

Adstringência

Falamos de uma sensação de secura e aspereza na língua, no palato e nas gengivas, cuja origem está vinculada à interação de certos compostos que reduzem a capacidade lubrificante da saliva.

O que é adstringência?

De uma perspectiva específica, a adstringência não é um sabor, mas uma sensação tátil na boca derivada da interação química de taninos e outros polifenóis com as proteínas salivares.

Ela é tipicamente percebida como uma rugosidade persistente na boca que pode modificar a percepção de outras características de sabor, como a doçura ou o amargor.

Sua presença na cerveja é influenciada por múltiplos fatores, incluindo os ingredientes utilizados, o pH do processo, a temperatura e o tempo de mostura, a lavagem do grão, a fermentação e o armazenamento.

A adstringência é particularmente relevante em estilos de cerveja onde a suavidade e o equilíbrio são fundamentais, como as pilsners.

No entanto, em estilos mais robustos, como stouts ou barleywines, uma leve adstringência pode ser aceitável, pois pode adicionar complexidade e contraste.

Quais são as causas da adstringência na cerveja?

Os taninos são os principais responsáveis pela adstringência e estão presentes principalmente nas cascas dos grãos e no lúpulo, com uma solubilidade que aumenta em temperaturas mais altas, pH alcalino ou tempos de mostura prolongados.

Além dos taninos — um tipo específico de polifenóis de alto peso molecular —, outros polifenóis como flavonoides, ácidos fenólicos e proantocianidinas podem contribuir para a adstringência na cerveja, especialmente quando oxidados durante a produção ou o armazenamento.

Ingredientes cerveja

A água utilizada na produção também desempenha um papel fundamental. Um perfil de água com alto teor de carbonatos pode favorecer a extração de taninos e outros compostos fenólicos, o que intensifica a percepção de adstringência.

A composição dos sais minerais na água afeta a forma como esses compostos interagem com a estrutura química da cerveja e com as proteínas da saliva.

O lúpulo, embora menos relevante que os grãos em termos de adstringência, pode contribuir com certa rugosidade quando são utilizadas variedades com alto teor de polifenóis (Cascade, Centennial, Chinook, etc.) ou quando há abuso no dry hopping.

O contato prolongado com o mosto ou a cerveja finalizada pode favorecer a extração desses compostos, especialmente se a maturação a frio não for manejada adequadamente.

Formação da adstringência

A mostura é uma das etapas mais críticas na formação da adstringência.

Um pH superior a 5,8 facilita a solubilização de taninos das cascas dos grãos, enquanto temperaturas acima de 76°C aumentam a extração de compostos fenólicos.

Escala pH

A moagem também influencia significativamente; uma moagem muito fina quebra as cascas em partículas muito pequenas, expondo mais superfície à extração e favorecendo a liberação de polifenóis indesejados.

Durante a lavagem do grão, conhecida como lautering, o excesso de água ou um pH inadequado pode arrastar taninos adicionais para o mosto.

Se a densidade do mosto coletado cair abaixo de 1,010, é provável que a extração de compostos adstringentes aumente.

Ajustar o pH da água de lavagem dentro da faixa ideal de 5,2 a 5,6 e controlar a quantidade de água utilizada ajuda a mitigar esse problema.

Fermentação e armazenamento

Durante a fermentação, embora a levedura não produza diretamente compostos adstringentes, certos defeitos podem potencializar a sensação de adstringência.

A presença de fenóis voláteis, especialmente em cervejas infectadas por leveduras selvagens ou bactérias, pode intensificar a secura e a rugosidade no paladar.

Além disso, uma fermentação incompleta ou o uso de leveduras pouco saudáveis pode gerar subprodutos que alteram a percepção da textura da cerveja.

O envelhecimento e o armazenamento também desempenham um papel importante. A oxidação de polifenóis durante essa etapa pode gerar compostos mais adstringentes e modificar a percepção sensorial da cerveja.

A exposição ao oxigênio favorece a formação de quinonas, que interagem com proteínas e contribuem para a sensação de aspereza na boca.

Um armazenamento inadequado, com flutuações de temperatura ou contato excessivo com o oxigênio, pode exacerbar esse efeito.

Efeitos na experiência sensorial

A adstringência impacta a experiência sensorial ao alterar a textura e o equilíbrio da cerveja.

No paladar, ela é percebida como uma secura persistente que pode obscurecer outros atributos, como a maltosidade ou a doçura.

Em estilos onde se busca um perfil suave e arredondado, como lagers ou cervejas de trigo, a adstringência é geralmente indesejada.

Cervejas envelhecidas em barril

No entanto, em cervejas com alto teor alcoólico ou com uma carga elevada de maltas escuras, uma leve adstringência pode até contribuir para a complexidade sensorial.

Em stouts, barleywines e certas cervejas belgas, um nível moderado de adstringência pode equilibrar a percepção de doçura e proporcionar uma sensação estrutural que enriquece o perfil global da cerveja.

A percepção de doçura pode ser reduzida pela presença de uma adstringência elevada, o que, em alguns casos, pode fazer com que uma cerveja bem equilibrada pareça mais seca do que o esperado.

Da mesma forma, o amargor do lúpulo pode ser amplificado quando há uma carga excessiva de polifenóis adstringentes, gerando uma sensação de aspereza desagradável.

Como controlar e minimizar a adstringência

A seleção de ingredientes é o primeiro passo para evitar a adstringência indesejada.

Escolher maltas de qualidade, com um bom controle do processo de maltagem, reduz a presença de compostos fenólicos indesejados.

Na mostura, controlar o pH dentro da faixa adequada e evitar temperaturas excessivas limita a extração de taninos.

Uma moagem equilibrada, que preserve a integridade das cascas sem gerar um excesso de partículas finas, também ajuda a manter a adstringência sob controle.

Moagem

Na lavagem do grão, evitar a superextração é essencial. Parar a lavagem antes de atingir uma densidade muito baixa e ajustar a química da água para reduzir o arraste de polifenóis minimiza o risco de adstringência.

Na fermentação, utilizar leveduras saudáveis e manter condições ótimas reduz a possibilidade de defeitos que possam intensificar a sensação de secura na boca.

O armazenamento adequado, com uma gestão precisa do oxigênio e condições de temperatura controladas, previne a oxidação de polifenóis e a formação de compostos adstringentes adicionais.

Utilizar barris ou garrafas com baixa permeabilidade ao oxigênio e minimizar o contato com o ar durante a transferência e o envase são estratégias-chave para preservar o perfil sensorial desejado.

Como identificar e avaliar a adstringência

Para identificar a adstringência na cerveja, é importante prestar atenção à sensação na boca e à persistência da secura.

Diferente do amargor, que é percebido nas papilas gustativas, a adstringência é sentida como uma rugosidade generalizada na boca e na língua.

Mapa da língua

Em certos estilos, ela pode adicionar profundidade e complexidade, enquanto em outros pode ser um sinal de problemas na produção.

Compreender sua origem e como ela influencia a percepção global da cerveja permite uma apreciação mais profunda e um critério mais informado ao avaliar uma cerveja.

Reflexões finais

A adstringência é um fenômeno complexo que pode influenciar significativamente a qualidade e a percepção de uma cerveja.

Seu controle não é apenas um desafio técnico, mas também uma oportunidade para ajustar o perfil sensorial de uma cerveja e potencializar suas características.

Referências

  1. Bamforth, C. W. (2006). Scientific Principles of Malting and Brewing. American Society of Brewing Chemists.
  2. Briggs, D. E., Boulton, C. A., Brookes, P. A., & Stevens, R. (2004). Brewing: Science and Practice. Woodhead Publishing .
  3. Mallett, John (2014). Malt: A Practical Guide from Field to Brewhouse. Brewers Publications.
  4. Hieronymus, S. (2012). For the Love of Hops: The Practical Guide to Aroma, Bitterness, and the Culture of Hops. Brewers Publications.

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Author Carlos Uhart M.

Director de contenidos en Zythos Media™. Redactor digital especializado en cerveza y gastronomía. Autor de "Guía Práctica para Catar Cerveza" y "Cocina y Coctelería con Cerveza".